E um dia novo vem nas entranhas deste céu alaranjado, um dia novo e um porvir.
Alguns de nós continuarão com sorrisos nos lábios e na alma, e farão amor como criança que descobriu coisa nova. Outros, acordarão com o pensamento longe, num sonho irrealizável ou na menina que os expulsou de casa a pontapés. E a menina pensará em seu vizinho bonito por algumas horas, e por outras, deixará a vida passar. Talvez venha a remoer por hora ou duas uma mágoa infundada, nada que seu coração irrequieto permita demorar-se.
Eu, bem desperta, sei o que me virá: um coração amargando o desfile na corda bamba, entre ser, não ser e estar, sem saber se o que sente é o que sente ou se muda conforme o sol assume seu posto.
São cinco da manhã e o sono não vem.
Vem-me antes o abismo das palavras não ditas, que sufocaram na língua antes que se materializassem no som. Vem-me a dúvida de saber suas conseqüências. Vem-me a ânsia de querer dizê-las quando já é tarde e não existe mais o que as motive.
Há um quê de trágico nas palavras ditas, não é? Uma vez expostas aos condutores auditivos do mundo, criam vida e tornam-se irrevogáveis, não se pode voltar atrás. E paira no ar a incerteza diante do que é definitivo. Arrependimentos, confirmações, coincidências, tiros no escuro.
Eu bem que podia dizer tantas coisas... Coisas que me preenchem a faringe e as falanges, que pedem, imploram para ser soltas, para concretizarem-se no plano real, mesmo que depois sejam dissolvidas pelo ar, pelos ouvidos, pelas mentes.
Mas é tarde, me atrasei. Fica aqui a eterna curiosidade, o eterno ‘e se’ envenenando minhas noites, essa cova aberta, essa interrogação a ser sepultada.
Quieta fico. Diante do insone, resta a madrugada e os pensamentos, mal-vindos ou não. Diante do intraduzível, resta o silêncio...
7 comentários:
Tem um trânsito legal nesse texto, ele expande o estilo que você tem usado nos seus últimos textos sem que a mudança de tom cause um choque no leitor incauto hehehe. Boas experiências, Lud.
Eu não consegui me identificar, mas sempre me apazigua tuas bem postas palavras...
Bjo!
Texto lindo e sutil... Parabéns, ficou suave e bem amarrado nos pequenos detalhes :)
Esse pareceu mais intimista e solto do que os anteriores, como se escrito na mesma madrugada que o inspirou. Mas eu gosto dessa espontaneidade sincera.
tô com o bardo nessa. ele está diferente dos anteriores não só na sutileza como no trato. porém, não menos bem escrito. [só a citação de falso soneto que achei meio cafona]
Olá, desculpe invadir seu espaço assim sem avisar. Meu nome é Nayara e cheguei até vc através do Blog somesentido. Bom, tanta ousadia minha é para convidar vc pra seguir um blog do meu amigo Fabrício, que eu acho super interessante, a Narroterapia. Sabe como é, né? Quem escreve precisa de outro alguém do outro lado. Além disso, sinceramente gostei do seu comentário e do comentário de outras pessoas. A Narroterapia está se aprimorando, e com os comentários sinceros podemos nos nortear melhor. Divulgar não é tb nenhuma heresia, haja vista que no meio literário isso faz diferença na distribuição de um livro. Muitos autores divulgam seu trabalho até na televisão. Escrever é possível, divulgar é preciso! (rs) Dei uma linda no seu texto, vou continuar passando por aqui...rs
Narroterapia:
Uma terapia pra quem gosta de escrever. Assim é a narroterapia. São narrativas de fatos e sentimentos. Palavras sem nome, tímidas, nunca saíram de dentro, sempre morreram na garganta. Palavras com almas de puta que pelo menos enrubescem como as prostitutas de Doistoéviski, certamente um alívio para o pensamento, o mais arisco dos animais.
Espero que vc aceite meu convite e siga meu blog, será um prazer ver seu rosto ali.
http://narroterapia.blogspot.com/
"o eterno ‘e se’ envenenando minhas noites, essa cova aberta, essa interrogação a ser sepultada."
adoro essa temática, bem manuel bandeira, bem humana de viver a fazer perguntas sobre a vida que poderia ter sido e não foi.
só vi um defeito: " e farão amor como criança que descobriu coisa nova."
eu mudaria essa comparação porque fazer amor como criança é coisa de pedobear.
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