quarta-feira, 9 de março de 2011

Às avessas

Eu te acho um completo filho da puta, sabia?

Mas ainda assim, sou capaz de te perdoar.

Pela cara que sei que você vai fazer ao receber a acusação, arregalando os olhos daquele jeito tão seu de se mostrar indignado – que sempre me fazia querer te beijar (outra razão pela qual te perdoar, aliás) –, eu te perdôo.

Eu te perdôo por saber me decifrar tão bem que chega a assustar. Por saber de certos pormenores meus que prefiro que o mundo desconheça, te perdôo. Por ter me visto – e me tido– mais vulnerável que qualquer outra pessoa no mundo, eu te perdôo.

Eu te perdôo por toda a insônia, pela ânsia e pelo desvelo. Te perdôo por ter sido exatamente o que precisei e por ter deixado seu gosto nos meus lábios. E na minha alma. Por me fazer não querer sentir outro gosto que não o teu, eu te perdôo.

Eu te perdôo por ter rido de toda besteira que falei e por me ter feito verter lágrimas de tanto riso. E pelas lágrimas de dor também, estas que chorei a salvo do mundo, sem testemunhas nem cúmplices. Te perdôo pela dor antecipada e pela delícia de cada dia que pude chamar de nosso. Por tudo isso, te perdôo.

Te perdôo por ter secado o sangue de uma unha que arruinei no chão cimentado e por ter culpado minha ébria afobação. E pela maldita riforcina que ardeu até os poros, mas você, muito sério, ministrou alegando extrema necessidade, eu te perdôo. No fundo, eu sei que você estava adorando me punir pelos excessos.

Te perdôo pelos livros emprestados sem consentimento prévio e até pelo amassado da capa ao tê-los de volta. Te perdôo por roubar meu sono. E meus chocolates favoritos, que você conseguiu encontrar no mais inencontrável dos lugares. Até por zombar dos meus discos de vinil e por espirrar feito um condenado com o cheiro de mofo das capas.

Te perdôo por me conter nos seus abraços. Te perdôo por ter respeitado meu nervosismo constante e onipresente, e por ter me permitido simplesmente ser – sem amarras, sem poréns, sem porquês. E mesmo que pouco, te perdôo por ter me aceitado.

Por me ter feito ceder, te perdôo. Por não ter sido o primeiro, te perdôo. E por não ter sido o último. Pelo sorriso permanente que você pintou nos meus lábios. Por ter me deixado pintar os teus de outra cor. Pelo silêncio confortável, eu te perdôo.

Por me ter olhado nos olhos e me feito acreditar num ‘algo mais’ que podia não ser só meu, eu te perdôo. Pela sinceridade, aguda, extrema, absoluta. Por ser belo, forte, terno – ao seu modo, eu te perdôo. Até mesmo por ser você – por ter nascido.

Por te querer. Por te perder. Por sentir tua falta. Por te ter tido. Por serem três da manhã. Por ser ridículo. Pelas lágrimas de agora que acho justas porque foram sorrisos e risos e sonhos de ontem (não que eu os tenha alimentado – você o fez por mim e ainda assim, te perdôo). Por querer te mandar ao inferno. Por querer que o inferno seja ao meu lado. Por fazer parte do meu passado. Te perdôo por tudo isso, até mesmo por você não ter razões pelas quais ser perdoado.

Só não te perdôo por não ter sido capaz de me machucar. Por isso, eu não vou saber te desculpar. Nunca.

12 comentários:

Anônimo disse...

Eu te perdôo por escrever assim, por se deixar transparecer assim...eu te perdôo por amar e por ser correspondida,por odiar e ser ainda mais amada.Te perdôo por ter ido mais além e permanecido aqui.

;*

(Mari)

Anônimo disse...

Porra, só faz me humilhar com esses textos belíssimamente escritos D:
me dá uns conselhos ;D UHASHUSAHUSAHU'
ficou fodão, irmã
bjo ♥

(DáliaMonts_)

Júlio Arantes disse...

eu nas tangentes e vc nos subentendidos... pense na moral que tem pra me dar conselho!

ahuahuhauhuhauhauhauahah...

=p

crap disse...

putamerda, que texto foda, lud. sério. um dos mais fodas que li nos ultimos tempos. queria ter pensado em mais da metade do que você escreveu, diaxo, queria ter pensado nesse texto antes de você.
inveja literária, lud, é um sentimento que ocasionalmente tenho. e agora me bateu pesado.

Isaac Moraes disse...

Li ao som de "come away with me - Norah Jones" (por coincidência).

Verti uma lágrima. Grato por proporcionar isso Lud :)

Victor disse...

Lud, Lud...

Texto fujão. Parece que não mas tá todo cheio de mistério.

Marden disse...

Texto muito bom, maninha.
Gostei do modo como você falou dos pequenos-detalhes-importantes-das-coisa-da-vida.
Continue assim.

Ps: Heath Ledger com certeza ficou orgulhoso.

Anônimo disse...

Eu aceito seus pedões, pura e simplesmente porque de tão pessoal e direcionado que seu texto foi, abriu possibilidades, inclusive de me enxergar como o sujeito passivo...

Karol Coêlho disse...

Lud, tem alguns momentos de nossa vida que procuramos um motivo pra amar alguém e simplesmente não encontramos... daí descobrimos que amamos um traste! Dois segundos depois, não mais que isso, percebemos o bem que o pdp faz as nossas vidas, os risos de dar dor na barriga, as chateações que demostram atenção, os cuidados que nos fazem morrer de vontade de matar de beijar. hehehe

Enfim, eu não sinto isso não, mas sei que tem pessoas que fazem sentir, talvez por já ter sentido.

Minha amiga, se isso não for puramente ficção e tiver um pingo de tuas verdades...

Ache esse traste e pegue pra você. ;]

ISA disse...

Muito feliz e orgulhosa que eu fico de vc, tão nova, já conhecer este sentimento único, mágico. Mesmo que vc sofra, viver é isso. É saliva e perdão.

Parabéns, irmã.

Te amo.

Marco Fischer disse...

Memórias podem ser guardadas como serpentes, que ficam se retorcendo em nossas entranhas, as vezes silenciosas e inertes até despertadas.

Ou podem ser como pérolas criadas com a memória dos bons momentos em volta dos ruins, bem guardadas de onde só saem para um rápido vislumbre de sua beleza.

Bom saber que você prefere a segunda opção.

nelson netto disse...

bom. menininha, mas bom.