quinta-feira, 5 de agosto de 2010

Inso(a)n(a)emente tua

Uma vez fora de mim, minhas palavras já não me fazem sentido. São como órgãos amputados, pedaços sem vida de algo que já foi muito importante e que não me pertence mais - não as controlo, não as conduzo, não as reconheço. Por isso, de nada elas me adiantam. Sou, sim, obrigada a expeli-las como quem vomita algo indigesto. E as entrego ao mundo sob uma promessa de paz - uma vez fora de mim, elas me darão um repouso que não conheço. Mito. Continuo tão inquieta quanto sempre fui. Um amontoado de sentimentos. "Eu sou todo coração, ele me bate em todo corpo".

É como agora. Me sinto obrigada a falar de você. A falar de como você tem tanta facilidade de manipular meu juízo, e o faz sem querer, talvez por não saber o estrago que causa. Falar de como espero tanto dos seus gestos e de como eles reproduzem tão pouco do que eu desejo. E de como todos os meus quereres esticam o tempo e me roubam o sono. Me vejo confessando segredos ao teto por noites inteiras e me sinto patética ao fim de tudo isso - meus troféus aparecem escuros sob meus olhos e denunciam a qualquer um que você foi a pauta da noite.

Mas de que adianta?

Você continua soberano nos meus pensamentos, no tremor das minhas mãos, na inquietude de não ter - e na pressa de querer. De que adianta perpetuar esse dilema em linhas tão mal traçadas se você não me deixa nem me toma?

'Teu nada é melhor que teu não', escrevi, certa vez. E arrependi-me. As palavras estavam lá, consolidadas, no papel, olhando-me como quem desafia: "negue-nos. Apague-nos. Seus próprios rebentos - mate-nos!". Admiti que uma tempestade não cabe num copo d'água - apaguei-as. Não. Antes teu não, que teu nada.

Prefiro chorar algumas lágrimas de rejeição, doídas, mas com prazo de validade, que viver alimentando expectativas como quem dá de comer à cria. Esperanças podem ser nocivas. Podem roubar o sono. Podem me fazer esquecer do que realmente importa. Prefiro viver com a certeza de que nunca seremos 'nós' que passar as noites dialogando com meu teto, na desesperada espera de um eterno talvez.

13 comentários:

Fig disse...

O que esperar de você, não é minha eximia escritora? Ainda terei o orgulho de ir numa sessão de autógrafos com o seu livro em mãos, esperando a assinatura que vou conhecer muito bem por essa minha vida.
Te amo Ludmila Monteiro.
Fig

Rafa disse...

Apesar do começo ligeiramente confuso (suponho que tenha sido intencional, mas não tive certeza de que era essencial à estrutura), não poderia expressar melhor a sensação de dúvida e o peso da espera por uma resposta. Não sei se foi por experiência ou não, mas gostei do texto porque ele foi em alguns pontos bastante literal. Espero que você consiga fazer outros assim!

kissu

Karol Coêlho disse...

Caramba, ainda não quero comentar esse texto. Preciso digerir...
Acho que foi um dos melhores textos que já li nesse mar de blogs que estão a nossa disposição.
Parabéns mesmo, Ludmila.
Achei o texto fantastico e forte, pesado, interessantíssimo.
Muito bom de ler e prende o leitor até o fim, saca? Quero ser assim quando crescer.
Essa história do livro, aí do "fig", leve a diante. Quero também um livro com autógrafo.

;*

Stéfany disse...

Faço do meu comentário uma extensão dos demais, Lud!
Adorei o modo como vc retratou a sensação de estar em dúvida, a inquietação, e essa esperança mesmo que as vezes mais maltrata que ajuda :)
Sensacional o texto, meus parabéns!
:*

Marden Linares disse...

Poxa, maninha.
Achei que você falou muito mas disse muito pouco.

Laís disse...

"Antes teu não, que teu nada." é sempre melhor, mesmo.

Luiz Alberto Machado disse...

Adorei seu blog, parabens. Indicarei nas minhas páginas. Aguarde.
Beijabrações
www.luizalbertomachado.com.br

Rivison disse...

Sempre que passo por aqui, gosto do que leio. Muito legal, Lud. Bjos.

Anônimo disse...

eu não gostei do começo. tipo o primeiro parágrafo.

mas depois o texto vai crescendo até o final, que eu achei foda. a "desesperada espera de um eterno talvez" é uma frase de enterrar caixão!

=**

João Pedro Laurentino disse...

Muito bom, Ludmila. Às vezes é melhor ter a certeza de que não dará certo do que ficar remoendo-se e sofrendo por algo que nunca acontecerá. Gostei mesmo. (:

Unknown disse...

Bonito seu texto e beem intenso. E como disse o Joao pedro, é melhor se conformar com a dura realidade, do que ficar remoendo algo inexistente. Beeijos.

Tay disse...

Me impressionei novamente. comolidar?
Mesmos comentários sempre, né? XD E... estou de volta 8D

laayycullen disse...

Sogrinha, você escreve muito bem!
Amo todos os seus textos, me identifico com alguns. Parabéns, você é simplesmente fodástica. *--*